Você sabe conjugar o verbo alussinar? Mas preste atenção na grafia: alussinar com dois “ss” mesmo…porque alucinar com “c” é muito fácil, e muita gente anda por ai fazendo isso…. O português é surpreendente, não é? Pois há 50 anos atrás, precisamente no dia 20 de julho de 1969 às 20h17min, a história da humanidade deu um salto e dois homens conseguiram alussinar. Eram os tripulantes da Apolo 11, que pousaram na Lua e deixaram os demais terráqueos boquiabertos com a façanha. Alussinar, portanto, significa pousar na Lua, o que provavelmente nem eu e nem você conseguiremos fazer nos próximos 100 anos, mas tudo bem, porque sem dúvida nós poderemos alucinar e fica tudo certo… ou não, dependendo do ponto de vista.
Assim, o alussinante astronauta Neil Armstrong foi o primeiro humano a pisar na superfície lunar, seguindo por Buzz Aldrin vinte minutos depois. Os dois ficaram por volta de duas horas e quinze minutos passeando na Lua ec coletaram 21,5 quilogramas de material. Ninguém avistou o Jorge – pelo menos não existem registros oficiais sobre isso -, mas proliferam, até hoje, várias teorias conspiratórias divertidíssimas sobre o assunto. Quanto ao dragão, nem pegadas foram relatadas, o que faz muita gente duvidar que os americanos realmente pousaram no nosso satélite natural. A América comemorou com grande entusiasmo o cinquentenário da alussinagem ou alussinação (agora parece que me perdi!) enquanto no Brasil estamos alucinando com “c”, e o pior, sem o Jorge, sem o dragão, mas fazendo festa.
Estou falando do novo derrame de crédito que vai acontecer na nossa economia. De acordo com especialistas, a aprovação da Medida Provisória 889, de julho agora, vai movimentar mais de R$ 100 bilhões, o que é excelente, até olharmos mais profundamente para o cenário. Trata-se da alteração da Lei do FGTS, que vai propiciar ao trabalhador sacar parte do valor depositado. A MP criou o “saque-aniversário” que nada mais é do que o saque anual de determinada quantia na data de aniversário do fundista. Diante da certeza da retirada anual e do saldo existente, o trabalhador poderá antecipar esses recursos junto a instituições financeiras, criando um mercado de recebíveis.
Acompanhe comigo: eu tenho saldo e possível crédito futuro e posso antecipá-lo. Quando antecipo esse recebível eu vou pagar juros por isso. Como o valor não é considerável e a intenção é atingir a classe mais pobre, o valor recebido e o valor antecipado não serão significativos, de forma que eu não conseguirei com o dinheiro disponibilizado pelo banco – com juros,- repita-se, comprar uma casa ou um bem durável que possa garantir a mim e à minha família determinada estabilidade ou liquidez imediata se algum dia eu vier a precisar de um dinheiro rápido. O que vai acontecer então? Eu vou comprar bens de consumo: Tvs (ainda primeiro lugar na preferência nacional seguidas de perto por geladeiras), smartphones, computadores, móveis e eletrodomésticos. Ou seja, bens que provavelmente vão ficar obsoletos enquanto eu ainda estarei pagando a antecipação do FGTS. Ou seja, eu vou fazer a economia girar: indústria, comércio e serviços, ao custo de me endividar com um dinheiro que é meu, mas que não tenho acesso total ao mesmo. Lembrando que no Brasil somos mais de 60 milhões de endividados, dos quais 30 milhões são superendividados. Lembrando ainda que não temos nenhuma política de educação financeira, o que faz com que sucumbamos à vontade de consumir o que não conseguimos pagar e que não pensemos no amanhã… afinal, podemos alussinar… o que faz toda a diferença…
Em tempo: quando Armstrong pisou na superfície lunar ele falou palavras que são repetidas até hoje no mundo inteiro: “É um pequeno passo para [um] homem, um salto gigante para a humanidade.” Eu entendo de passos, de saltos e agora entendo de gigantes, e cada vez mais tenho a certeza que eles são possíveis e reais e não apenas alucinação.
Renata Abalém é advogada, Diretora Jurídica do IDC – Instituto de Defesa do Consumidor e Contribuinte, Fundadora da ABRASAÚDE – Associação Brasileira de Usuários de Sistemas de Saúde, Planos de Saúde e Seguro Saúde. Conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil 2016/2021 e Presidente da Comissão de Direitos do Consumidor da entidade no mesmo período
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